a porta
acabei por me despir. quando olhei para trás, as roupas tinham desaparecido. pareceu-me ver um rasgo de tinta escapar por baixo da porta fechada. instalei-me ali, no lugar. encostei-me às paredes, rocei-me por todas as superfícies. tacteei o chão. as mãos secaram e lambi-as. atravessei o lugar. medi-o em pés. medi-o em corpo. atravessei o lugar. e bati, bati com toda a força na porta. chamei. atravessei o lugar. chamei. nunca responderam. nem mesmo se distrairam. quando os homens se distraem deixam a televisão acesa e posso imaginá-los no fundo do corredor, atrás de outra porta, sentados à volta de uma mesa a discutir. às vezes o meu barulho provoca um silêncio. mas isso não aconteceu. agarrei-me a mim. dobrei-me. a minha explicação ficou do lá de cá da porta.
às vezes adormeço. sonho com terra lavrada, extensões imensas cultivadas, toco as plantas, os meus dedos sentem a textura das folhas, ouço um ribeiro que corre, levo à boca a água fresca. e acordo com frio. urlo. mas a porta não abre. ontem reclamei tanto que jorraram litros de tinta vermelha. entraram por debaixo da porta. aproximaram-se primeiro dos pés e, como uma ligadura, foram-me envolvendo. a tinta fez um nó nos tornozelos, à volta dos joelhos, nos pulsos, cobriu-me a boca. a tinta atou-me. fiquei imóvel e muda.
se a porta não abrir, ninguém vai saber.
quando não penso em nada, pequenos laivos de cor vão desaparecendo.
já tenho os cabelos soltos. as mãos libertas. movo os lábios. grito: abram a porta.
um líquido azul desce pela fechadura. inunda-me. não é que doa mas a cada tentativa, este lugar enche-se de cor.
consegui virar-me. de costas para a porta, talvez os engane. o suficiente para voltar a grunhir que quero a porta aberta para explicar. eu tenho uma teoria. eu tenho provas. vão cair paradigmas. quando olharem uns para os outros, homens e mulheres vão deixar de se reconhecer.
nos cantos do lugar apareceram pingos amarelos. pequenos fios cor de laranja cercam-me os seios. as minhas lágrimas são verdes.
eu tenho uma teoria. não sei porque não abrem a porta.
às vezes adormeço. sonho com terra lavrada, extensões imensas cultivadas, toco as plantas, os meus dedos sentem a textura das folhas, ouço um ribeiro que corre, levo à boca a água fresca. e acordo com frio. urlo. mas a porta não abre. ontem reclamei tanto que jorraram litros de tinta vermelha. entraram por debaixo da porta. aproximaram-se primeiro dos pés e, como uma ligadura, foram-me envolvendo. a tinta fez um nó nos tornozelos, à volta dos joelhos, nos pulsos, cobriu-me a boca. a tinta atou-me. fiquei imóvel e muda.
se a porta não abrir, ninguém vai saber.
quando não penso em nada, pequenos laivos de cor vão desaparecendo.
já tenho os cabelos soltos. as mãos libertas. movo os lábios. grito: abram a porta.
um líquido azul desce pela fechadura. inunda-me. não é que doa mas a cada tentativa, este lugar enche-se de cor.
consegui virar-me. de costas para a porta, talvez os engane. o suficiente para voltar a grunhir que quero a porta aberta para explicar. eu tenho uma teoria. eu tenho provas. vão cair paradigmas. quando olharem uns para os outros, homens e mulheres vão deixar de se reconhecer.
nos cantos do lugar apareceram pingos amarelos. pequenos fios cor de laranja cercam-me os seios. as minhas lágrimas são verdes.
eu tenho uma teoria. não sei porque não abrem a porta.
abri a porta quando o silêncio se prolongou por vários dias.
ela dormia. julgo que já não vai acordar.
o lugar ficou tingido de verdades coloridas.
não reconheci nenhuma.
por que persistiu? vou precisar de muita água.
- o guardião